07/10/2009

As incertezas dos tempos que correm.

O título desta coluna dá nome ao fabuloso poema a seguir transcrito:

Que lindo dia o que vemos!
Mas, como estes tempos vão,
É bom que não confiemos...
É melhor dizer que temos,
Não um dia de verão,
Mas um dia de veremos.

[Fernando Pessoa, “Diferença de Pessoa”, Poesia (1931–1935 e não datada), p. 486].

E eis que hoje acordei mais cedo. Eram cinco horas quando a água começou a ferver. Passei o café, acendi um cigarro. O Atlético na cabeça. Abri a janela “Que lindo dia o que vi”. O ar fresco e as primeiras cores da manhã pintavam diante de mim uma tela onde Curitiba parecia enfim reabilitada, restabelecida. Diante de mim, a Curitiba da infância, cidade reprisada, resgatada.

Liguei o rádio - e antes que ouvisse canção, ou que canção houvesse – o locutor atualizou os números da chacina. Será a última? “Mas, como estes tempos vão”, pensei, antes de acrescentar “É bom que não confiemos...”. As incertezas dos tempos que correm. A vida geral a me martelar a cabeça. A vida e suas incertezas. Servi-me de café, acendi mais um cigarro. Não demorou muito: o Atlético – uma vez mais, e sempre e como sempre - na cabeça.

Hoje à noite, enfrentaremos o Grêmio, na Arena da Baixada. Jogo dificílimo. A gente, na função de colunista, às vezes dá ao leitor a impressão de que temos todas as respostas. Mal eles sabem que dentro de cada colunista há um torcedor comum, cheio de dúvidas e angústias, cheio de interrogações e incertezas.

O leitor – penso, em minhas infinitas divagações - deve achar que possuímos o dom sobrenatural de prever o futuro. Quem sabe ele acredite que a gente detém a posse de uma bola de cristal capaz de nos antecipar os fatos. Aflito em sua condição de torcedor, o leitor procura em nossas colunas as respostas que, em verdade, não temos, pois colunista nenhum tem.

E, diante da minha franqueza com o leitor, muitos me censuram: Rafael, se o leitor acha que a gente, como colunista, tem o dom de prever o futuro; se ele acha que possuímos bola de cristal que nos antecipa os resultados; ou um conhecimento profundo do futebol a ponto de enxergarmos coisas que os olhos dos torcedores comum não veem, nada de lhe afirmar o contrário! Premonição, bola de cristal e profundos conhecimentos sobre o esporte bretão: “É melhor dizer que temos”.

Não posso frustrar o leitor, tampouco posso me furtar ao duro ofício que é ser colunista. Aqui estou – apesar de toda incerteza – para tecer comentários a respeito deste Atlético e Grêmio que, hoje, martela-nos a cabeça, o coração, os nervos e todo o resto do corpo, como convém, aliás, a todo Atlético e Grêmio que se preze.

Nosso Atlético adentrará o gramado da Arena da Baixada vindo de duas belas apresentações em terras paulistanas. Contra o Palmeiras perdeu, merecendo ganhar. Contra o Corinthians ganhou, sem ressalvas, com inteira justiça. Assisti aos dois confrontos, atentamente, e talvez seja a atenção redobrada que faz o colunista ter olhos mais experimentados do que os do torcedor comum.

Vi o Palmeiras jogar, e ele não me impressionou. O Palestra, embora esteja líder deste campeonato tecnicamente fraco, é um time onde o conjunto compensa a falta de grandes jogadores e onde a liderança do goleiro Marcos e a estrela do competente e trabalhador Murici fazem toda a diferença. Todavia, o Palmeiras, em análise fria, é um time comum. O atual elenco é muito inferior aos times montados no Parque Antártica no biênio 93-94 e em 99, quando enfim os verdes paulistanos se sagraram campeões da América.

O Palmeiras, nos confrontos contra Cruzeiro e contra nós, apresentou fragilidades que, em sendo bem exploradas pelos próximos adversários, podem resultar na perda de pontos preciosos nos últimos onze compromissos do brasileirão 2009 e que podem, sim, afastar do Palestra o título de campeão do Brasil desta temporada. O Palmeiras está jogando no limite e não me parece ter fôlego para um eventual sprint, se isso vier a ser necessário.

Vi o badalado Corinthians, do baladeiro Ronaldo. O Corinthians, notoriamente, largou os betes. Depois de retornar à Divisão de Elite, conquistou o Paulistão e levantou a Copa do Brasil. Agora cozinha o galo, pois não corre o risco de cair e porque a vaguinha da Libertadores 2010 já está assegurada. A esquadra mosqueteira vem só cumprindo tabela, guardando-se para o ano do Centenário que, na vida dos times grandes, costuma ser coroado por títulos significativos. Batemos o Corinthians, com autoridade, jogamos muito bem contra o Palmeiras, mas não pensem os senhores que isso nos torna amplamente favoritos à vitória na noite de hoje.

O Atlético, por paradoxal que pareça ser, tem jogado melhor longe da Baixada. Fora de casa conseguimos duas vitórias expressivas neste Nacional (contra Cruzeiro e Corinthians), mas em nossos domínios, mesmo quando a vitória nos sorriu, o time não convenceu a maioria da torcida, exceções feitas à vitória contra o Barueri e ao segundo tempo contra o São Paulo, no jogo que marcou a inauguração do Setor BI. No mais, o Atlético não jogou bem em casa, infelizmente.

Com 34 pontos em 27 partidas, o Atlético é um time irregular. Tem como pontos negativos um goleiro invariavelmente inseguro sob as traves e na criação um pouco inspirado Marcinho. Tem como pontos positivos a força do futebol do aguerrido Paulo Baier e essa juventude que desponta promissora no horizonte Rubro-Negro.

Com 34 pontos em 27 jogos, o Atlético vai à busca dos 45 pontos que livram, segundo dizem, todo clube do rebaixamento. Não será tarefa difícil como foi no ano passado, mas, convenhamos, é aspiração pequena demais para quem foi campeão brasileiro em 2001 e esteve perto do bi três anos mais tarde. Escapar do rebaixamento e obter vaga para a insossa Copa Sul-Americana não é de todo ruim, mas está longe daquele Atlético Total ou daquele Atlético-3000 que tantas alegrias nos deram.

Hoje, diante de nós, o sempre perigoso Grêmio. Não se iludam que o empate por 3 a 3, entre Grêmio e Sport, no Olímpico, tenha retirado do tricolor gaúcho a fome de vitória, até porque um time que conta com Souza, Jonas e Maxi López não pode ser subestimado e torna ainda mais dura a missão de nossos homens de defesa, sejam eles: Galatto, Éverton, Fransérgio, Chico, Rafael Miranda e Valencia.

Minha previsão é de jogo duríssimo na Arena da Baixada. Premonição, bola de cristal e profundos conhecimentos sobre o esporte bretão: “É melhor dizer que temos”. A gente, na função de colunista, às vezes dá ao leitor a impressão de que temos todas as respostas. Mal vocês sabem que cada colunista é um torcedor comum, cheio de dúvidas e interrogações.

Hoje não é dia de verão, hoje é noite de veremos. Oxalá nos venham mais três pontos para diminuir as angústias e as incertezas dos tempos que correm na vida da gente Atleticana.